quarta-feira, 8 de abril de 2015

Livro: Uma metodologia de interpretação musical - Sonia Albano de Lima

Livro: Uma metodologia de interpretação musical - Sonia Albano de Lima



 Contexto: 

 Comprei esse livro durante o Festival Música nas Montanhas em 2015, ao sair de uma das aulas. Lembro-me que estava sem dinheiro trocado e fui até o hotel para pegar correndo pois era o último dia que a banca estaria montada. Me interessei por sentir necessidade de material de estudo de fraseologias e interpretações.

 Descrição:

 Esse livro é resultado da pesquisa da autora sobre a metodologia de ensino do professor Walter Bianchi, um dos grandes nomes na área de interpretação musical. O objetivo do livro, aparentemente,  é o de "salvar" historicamente esta metodologia visto que não há outros registros sobre a mesma. O livro contém 3 partes:

Conversa com o leitor -  Neste trecho há o esclarecimento e a fixação do objetivo do livro e  uma contextualização do pensamento musical de Bianchi divididos em 3 capítulos Subjetividade e interpretação, A relação da música com a linguagem verbal e Lei natural e interpretação.

 As duas partes restantes estão dentro da sessão Fontes do livro. Sendo elas

 Entrevistas, Onde estão as transcrições literais das entrevistas gravadas em áudio com o próprio professor Bianchi e com a pianista Maria Elisa Risarto, Além das respostas escritas de outros alunos à um questionário elaborado pela autora.

Duo de piano, Onde se tem comentários e marcações do professor sobre trechos da Sonata em Si bemol maior K. 358 de Mozart para piano a 4 mãos.




 Resumo / Comentários:

 Optei por comentar as partes por separado. Então vamos lá

 Conversa com o leitor

 Da forma como o índice é organizado, essa parte é "o livro em si". Portanto ela deveria ser completa por si só e cumprir todos os objetivos do livro, sendo a sessão "fontes"  um complemento. Quanto a esse objetivo, não sei exatamente se o considero alcançado ou não no livro.

 O motivo de considerá-lo alcançado é porque de fato expõe tópicos julgados importantes em cada capítulo. No capítulo 1 é discutida a questão das aulas serem subjetivas ou não. Onde se afirma e se argumenta a favor de ser uma metodologia "técnica e nada subjetiva". No capítulo 2 é exposta a comparação que o professor faz da "linguagem músical com a linguagem escrita" onde se extrai que as inflexões da fala em um discurso que despertam as emoções do ouvinte (tomando cuidado com o conceito de "emoções", foi este o termo usado no livro) e que a ideia da interpretação seria usar destes recursos para que a música desperte o máximo de emoções possíveis em cada ouvinte. No capítulo 3 é mostrada a visão cosmológica sobre a música.

 Porém, os focos e forma como o livro foi escrito me deixam dúvidas de onde ela quer chegar e não me convence de sua proposta.

 No primeiro capítulo há a questão da subjetividade x técnica do professor, onde se defende um lado técnico. Só que essa técnica não é apresentada claramente. O que se apresenta são formas de grafia para o pensamento interpretativo (que são bem interessantes. Chegam ao ponto de parecerem óbvias, mesmo que quase ninguém pense nelas) e alguns exemplos de trechos musicais comentados. O primeiro problema desse capítulo é que se a ideia do livro é salvar a técnica desse professor, o livro não o faz... visto que as ideias marcadas pelo professor não são demonstradas de maneira técnica, e sim de uma espécie de subjetivismo bem fundamentado. Além disso, o capítulo diz que durante as aulas  o professor mostrava como frases poderiam ser interpretadas de maneiras diferentes ( o que seria muito interessante de se ver) mas o livro só mostra a opção escolhida para a obra. Ou seja, o campo de material para ser trabalhado como técnico se reduziu ao escolhido para aquela aula. Claro que não dá para esperar uma "receita de como interpretar músicas", mas uma gama de recursos interpretativos fariam do livro muito mais completo. Tal gama que o professor demonstra ter, mas não é "salvo"

 Outra coisa que me incomoda é a disposição visual do livro. Particularmente não gosto de um texto falando de uma partitura que só vem depois de totalmente explicada... para mim faz mais sentido que a partitura venha antes. Para que leiamos e voltemos a partitura para ver se chegamos a mesma conclusão.

 O segundo e o terceiro capítulo parecem sofrer de "crise existencial" pois, embora se demonstrem importantes na ideologia e filosofia do professor, não se sustentam como capítulos a parte. Não como materiais de técnica conforme o livro diz ser. O segundo capítulo até tenta comparar inflexões de linguagem oral/escrita com linguagem musical, mas carece de exemplos e analogias. Já o terceiro capítulo aborda a cosmologia e a visão que o professor tem de Deus, mas isso pouco acrescenta no entendimento da lógica interpretativa passada por Bianchi.

 Os capítulos possuem citações de duas professoras minhas (Lia Tomas e Yara Caznok) que são muito legais, Porém o livro não dialoga muito bem com elas, confesso não ter lido (ainda) o livro dessas professoras mas, por ter tido 2 anos de aulas com cada uma delas, tenho uma certa noção do que cada uma pensa sobre o assunto e não parece ser muito bem como a autora expõe no livro. Outra citação bem interessante é extraída de Hamlet, onde Shakespeare faz uma crítica a interpretação dos atores através do personagem.

 Entrevista

 Essa parte do livro com certeza é a mais divertida do livro, tratam-se de duas entrevistas com o professor, uma com uma aluna pianista e alguns questionários de outros alunos (incluindo o questionário de Maria Elisa Risarto, que também tem a entrevista escrita).

 Digo ser divertida por serem transcrições literais das fitas, então foram parar no livro algumas "discussões" entre entrevistado x entrevistadora que trazem um certo tom de "entrevista de revista" para o texto. O que me incomodou um pouco foram as perguntas, que parecem "empacar" um pouco do desenvolvimento da conversa. Além disso, percebe-se que grande parte do livro foi escrita sobre essas entrevistas, o que não dá muito crédito ao resultado como trabalho científico, por ser pouco material de base. Ambos os entrevistados demonstram maturidade e individualidade. Algumas respostas são bem interessantes, gostei bastante do questionário + entrevista de Maria Elisa.

 Duo de piano

 A parte mais interessante do livro, são transcrições de aulas dadas no desenvolvimento de uma peça a quatro mãos. O texto contém alguns trechos comentados e explicados com o porque de cada interpretação. Uma pena que o livro não vem com um CD para ouvirmos o "antes e depois" dos comentários. É a parte do livro que dá para extrair a maior parte de informações interessantes. Pena que é apenas uma única peça. Seria muito mais interessante se fossem várias aulas gravadas, de diferentes peças, com diferentes formações, de diferentes estilos. Aí sim daria para "salvar" a metodologia deste professor.


 É isso aí gente, acabei me decepcionando um pouco com o livro pois esperava outra coisa. Ainda assim, é um livro com seus méritos que pode ser aproveitado de outras formas.
 Um abraço a todos e lembrem-se que, segundo Bianchi, toda frase musical tem seu nascimento, clímax, morte e relação com a frase anterior
 Augusto Girotto

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